Por Thomaz Antonio Barbosa
No Brasil ainda existe o estereótipo ou preconceito de que para ser índio tem que usar cocar, se pintar de urucum, andar nu ou vender miçangas nas esquinas das grandes cidades.
Porém, se frequenta universidade, vai ao happy hour, viaja de trem ou avião, fala uma língua estrangeira, possui um cartão Master Class ou mora em um condomínio fechado não é mais índio, é um espertalhão, não merece exercer os benefícios constitucionais a eles assegurados.
Ora, minha gente, indígena é etnia e não condição social ou concepção de vida, necessariamente não precisa de pirotecnia ou obrigatoriamente viver no limbo, sem o direito de usufruir dos bens sociais.
É inimaginável na sociedade brasileira, dita plural e igualitária, uma Ferrari parar em uma esquina qualquer, sair de dentro dela um indígena, balançando as chaves, dando gorjeta para o manobrista, conduzir a esposa pelo braço, os filhos, e entrar em restaurante de primeira classe. Principalmente, um nascido no interior do Amazonas ser médico Especialista em Medicina Intensiva em um hospital de referência do estado.
Não, o Tuyuka não possui uma Ferrari, tampouco um cartão Master Class, nem mora em um condomínio fechado, todavia, não podemos deixar que o paradoxo construa o paradigma!
Antes do presidente Lula nomear duas indígenas – de cocar – para cargos relevantes no Executivo Federal e isso irradiar o Brasil com a expectativa de um novo olhar do país sobre os povos originários, Israel Tuyuka, de São Gabriel da Cachoeira, já havia quebrado esse paradigma, rompido a bolha do coitadismo, destruído o estereótipo e fincado uma nova imagem do nativo no contexto nacional.
Uma história interessante
De repente estou no escritório, ao entardecer, quando me chega a mensagem “camarada, topa ser o vice da chapa?”. Virei a atenção para o texto e percebi que se tratava da eleição no Amazonas. Então, para tirar todas as dúvidas perguntei se seria senado ou governo. A resposta foi “governo mesmo, vice do Tuyuka”.
Eu havia visto o Dr. Israel Tuyuka somente uma vez, exatamente no dia anterior, na convenção Psol-Rede, onde o cargo de vice foi destinado a uma mulher, porém não foi definida a personagem. Eu li de novo a mensagem e topei sem pestanejar, era a primeira candidatura de um indígena ao governo do Amazonas.
A história é longa, todavia, durante o processo eleitoral conheci um cidadão admirável, um homem difícil, com suas dúvidas e interrogações, mas com um desejo inabalável de servir, deixar uma marca, contribuir com a trajetória do seu povo, recuperar o lugar na história e nos domínios do território, equalizando uma política de igualdade racial e social em todo o estado brasileiro.
O Psol-AM deu o primeiro passo com a chapa encabeçada por Israel Tuyuka, apesar dos percalços, obtivemos mais de 22 mil votos válidos, a maior votação do Partido até agora no estado. Parece pouco, mas a montanha que subimos juntos é maior do que o abismo de onde viemos. A participação do Psol nas eleições estaduais também se constitui na quebra de outro paradigma, do partido pequeno, sem quadros, sem penetração no eleitorado.
Porém, recomeçam os desafios para os povos indígenas e para a mestiçagem brasileira, onde a organização social e política se faz necessária para percorrermos nossos caminhos. O governo do país é novo, mas a pegada é antiga e a derrota acachapante do PT no Amazonas na última eleição nos coloca em pé de igualdade no front da esquerda no estado.
O Psol está vivo, no protagonismo desse processo, não mais aceitaremos papéis secundários no tocante à disputa eleitoral, pois a construção de um governo de esquerda passa pelo crivo dos nossos quadros.
A prefeitura de Manaus será disputada em 2024, de minha parte estou pronto para essa discussão, creio que o Tuyuka também, sem pirotecnia nem coitadismo, ele é a prova de que ser índio, sujeito do processo, é possível, assim como o Psol-AM, o testemunho vivo de que conquistar a hegemonia em nossa terra é tarefa provável.
Portanto, é hora de prosseguir!